"O importante e bonito do mundo é isso: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas,
mas que elas vão sempre mudando. Afinam e desafinam"

Guimarães Rosa

16 de jun. de 2012

OS IDEAIS FEMININOS DE CONSUMO NA CONTEMPORANEIDADE: A MOBILIZAÇÃO DO PULSIONAL COMO ESTRATÉGIA PUBLICITÁRIA


Joice Rusch*  

       Nesse estudo foram pesquisados os ideais femininos de consumo em busca da “beleza” e “felicidade” veiculadas pela publicidade na sociedade de consumo atual, por meio de uma contextualização histórica do espaço social da feminilidade. A questão se amplia à medida que as estratégias da publicidade mobilizam a pulsão inerente ao indivíduo, levando a mulher a expandir a ânsia pelo consumo de produtos que mantém os ideais de “beleza” e “felicidade” propostos pela cultura. Pensar nas ideologias que sustentam essa dimensão consumista feminina na sociedade contemporânea é um passo para compreender o consumo desenfreado. Para o desenvolvimento da discussão, foi realizada uma pesquisa de cunho bibliográfico, que fundamentou a análise dos ideais femininos atualmente. Verificaram-se as sutilezas pelas quais a publicidade, ao mobilizar a pulsão, transfere para os produtos comercializáveis investimentos fantasmáticos a fim de manter os ideais femininos na Contemporaneidade. 
O objetivo geral do trabalho foi identificar os ideais femininos de consumo na Contemporaneidade por meio de uma contextualização histórica do papel assumido pela mulher na cultura Ocidental.  Os objetivos específicos foram: compreender a atual ânsia feminina na busca pelo padrão de beleza proposto para ser  “feliz” decorrente da cultura Contemporânea e, identificar que feminilidade é essa dominada pela publicidade, a qual reduz a mulher a um padrão fantasioso, na constante busca pela “beleza” e “felicidade”
Propõe-se que a mobilização do elemento pulsional poderá vir a ser a estratégia publicitária usada para garantir a busca constante por padrões ideais de  “beleza” e “felicidade”. A análise desta problemática visa “abrir questionamentos”, rompendo a concepção “naturalizada” da feminilidade atrelada ao universo dos cosméticos, shoppings, cirurgias plásticas, academias, etc.
Esta pesquisa tem como base a relação indivíduo-sociedade, partindo da visão de que o homem constrói e é construído por meio de suas relações, com a mediação da cultura, o que permite compreender que a sociedade afeta a subjetividade dos indivíduos, mas não a determina.
Para conduzir a investigação utilizou-se da técnica de pesquisa bibliográfica, que conforme Gil (2006) consiste no levantamento de bibliografias de cunho científico, que tenham relação com o objeto de estudo, respaldando posteriormente as análises. A principal vantagem da pesquisa bibliográfica está no fato de permitir maior exploração do conteúdo pesquisado. Além disso, é uma pesquisa que parte de uma análise qualitativa-interpretativa dos fatos (REY, 2005).
Por meio da contextualização histórica da feminilidade percebe-se mudanças na imagem da mulher, seja na concepção física, cultural, social, política, entre outras. As mulheres escondidas, guardadas, invisíveis, reprimidas, perseguidas através dos séculos passaram a ocupar lugares diferenciados na sociedade contemporânea. A opressão que de forma mascarada se tornou libertação, acarretou para a feminidade outras estratégias de controle, como o surgimento de ideais de consumo, beleza, saúde e jovialidade, apontando o consumismo como outra forma de opressão.
Seria nesse contexto de mudanças que a publicidade se engrenou a desenvolver estratégias para que os produtos pudessem prometer suprir a falta, que na verdade é própria do sujeito e nunca será plenamente satisfeita. Assim, descreve-se a sociedade Contemporânea marcada por subjetividades debilitadas, isto é, afetadas no psiquismo e sem visão crítica em relação às estratégias ideológicas da publicidade, como a competição pelo corpo mais perfeito, a inveja por não se enquadrar ao ideal feminino, a magreza, as correções estéticas, em conseqüência da alienação pela busca de ideais inatingíveis. 
Como estratégia de controle, verifica-se as articulações da publicidade ao criar ideais para favorecer o consumo, colocando a feminilidade como condição de mercadoria, como: as modelos que vendem os produtos e a sua imagem como ideais. A publicidade utiliza a estratégia de mobilizar a pulsão para que o sujeito busque incessantemente a satisfação por meio de produtos que nunca poderão oferecer a satisfação total, pois a satisfação obtida é fantasiosa, passageira, insignificante (BORGES; RODRIGUES, 2000).
     Segundo Valença (2003) as estratégias da publicidade em difundir produtos a todo instante para que seja mantido os ideais femininos, incita no sujeito a falta de opinião crítica sobre o consumo desses produtos. A falta primordial, que constitui o sujeito ajuda a manter o consumo desenfreado, assim, nenhum objeto dá satisfação plena, incitando a busca por algo novo e diferente, com a promessa de satisfação, que não passa de ilusão e fantasia.
Concluímos que uma forma de resistir aos ideais femininos de consumo seria desenvolvendo a capacidade de pensar, refletir e desfetichizar o produto, deparando-se com a condição humana de incapacidade de satisfação plena. Além de refletir sobre esse consumo, é preciso reconhecer e aceitar o próprio desejo, a própria verdade, e não a verdade externa exaltada pelas mercadorias. Esta discussão inicial pretende dar base para novas pesquisas na área da Psicologia, entre outras áreas, na medida em que ajuda a esclarecer a lógica utilizada pela publicidade com o discurso sedutor de idealizar os produtos para a exaltação dos ideais femininos de consumo em busca de “beleza” e “felicidade”, bem como clarifica os riscos ideológicos da publicidade no que tange as relações destrutivas, a competição, a inveja, entorno da mulher enredada na lógica do consumismo. 

* Joice Rusch é psicóloga.

Para saber mais:
BORGES, D.T.B; RODRIGUES, J.F.S.  Imagens femininas e a liberação do desejo: mídia e sexualidade. In: O corpo ainda é pouco: II seminário sobre a contemporaneidade.  Orgs. Sonia T. Lisboa Cabeda; Nadia Virgínia B. Carneiro; Denise Helena P. Laranjeira. Feira de Santana: NUC/UEFS, 2000.
REY, F.G. Pesquisa qualitativa e subjetividade: os processos de construção da informação. São Paulo: Pioneira Thomson Learing, 2005.
VALENÇA, C.A.M. A feminilidade em Freud e na contemporaneidade: repercussões e impasses. Recife/março 2003. Disponível em < http://www.unicap.br/tede//tde_arquivos/1/TDE-2006-12-20T145831Z-51/Publico/Maria%20Araujo.pdf > acesso em 20 de março de 2011.

1 de jun. de 2012

PAIS IGUAIS, FILHOS DIFERENTES


Fernanda Rossi*
      Uma das dúvidas mais frequentes dos pais é por que meus filhos são tão diferentes se os criamos iguais? Bem, algumas reflexões se fazem necessárias frente a esta questão. Primeiro, será que os pais são os mesmos sempre? E segundo, é possível ter filhos iguais?
     Com relação ao primeiro ponto vamos analisar: a vida é feita de experiências, a cada nova circunstância aprendizados são tirados e impactos sobre o comportamento, os valores e o jeito de ser podem surgir no cotidiano de cada pessoa. Assim, com o passar dos anos as pessoas mudam, mesmo que de forma leve e suave. A partir desta idéia podemos entender que os pais não são os mesmos para seus filhos, porque entre o nascimento de um e outro, muitas coisas aconteceram e os modificaram. E isto só no aspecto individual, que dirá das outras esferas. Pois os filhos nascem em momentos de vida também diferentes. A vida social, econômica, espiritual e do próprio casal também difere ao longo dos anos. E todas essas circunstâncias influenciam em como os pais criarão seus rebentos. Não há comparação entre a postura de uma mãe com o primeiro filho para com o caçula. Sua calma, paciência, disponibilidade e ansiedades serão outras em cada momento.
    O desenvolvimento de cada indivíduo depende de três fatores, sendo eles os inatos - características de temperamento com as quais nascemos (mais agitados, mais calmos, por exemplo). Mais as características do mundo externo - ambiente, situação sócio-econômica e cultural. Aliados a própria família - valores, ideais, características de personalidade dos pais, forma de se relacionar com o mundo a sua volta, qualidade e estilo de vida do casal, número de filhos e etc. Todos esses fatores se somam e pesam sobre a construção da personalidade de um indivíduo.
      Desta forma, um filho nunca será criado de forma igual a outro. No máximo com critérios semelhantes, mas ainda assim haverá diferenças. Um novo filho, novos pais. Com uma mente e momento de vida diferenciada. 
       Mesmo para filhos gêmeos. Neste caso a diferença reside na afinidade. Cada filho atrai os pais de forma muito única. Com um há maior afinidade, com outro menos. E isso não significa mais ou menos amor. Tem haver com identificação. Há filhos mais parecidos com o pai, o que por vezes pode aproximá-los ou até repeli-los. E isto pode ocorrer tanto da parte do progenitor, quanto da própria criança. Há uma identificação maior ou menor com cada um. Pense na sua família de origem, em quem você era mais ligado, na sua mãe ou no seu pai? Significava que você amava mais a um e menos ao outro, ou apenas que as afinidades eram diferentes? Isso acontece em toda família, alias até na roda de amigos, gostamos de vários, mas com um se tem uma intimidade e facilidade de conversar maior.
     E com situações assim permeando o desenvolvimento não tem como os filhos serem criados iguais. 
   Em segundo lugar, os filhos são díspares porque são pessoas diferentes. Com temperamento, personalidade, gostos, prazeres e forma de entender o mundo, únicas e particulares. Assim, até uma mesma situação é vivenciada por cada pessoa com impactos distintos. Ou seja, numa mesma família as regras, limites, permissões e amor podem ser iguais, entretanto a forma de compreende-las não será a mesma para todos os filhos. Um aceitará bem, outro não, um pode compreender a situação de forma próxima aos pais, outro não e assim por diante.
   Muitas vezes os pais comparam os filhos, destacando tais diferenças. O que traz conseqüências desagradáveis. Ao comparar, se diz que um está certo e o outro errado, os pais tomam partido de um filho e deixam o outro com sentimento de negativa, o que cria mágoa, competição e rivalidades que poderiam não aparecer, ou ao menos em menor intensidade. Pois cada filho, aliás, cada ser humano, é único e não tem como ser / agir como outro. 
      Além do mais, ser diferente é ruim? O que será difícil em aceitar cada um como é? Sem estipular que há um único modelo, um jeito certo de ser. Algo que beira a utopia. Claro que pessoas distintas causam na família como um todo impactos e influencias que nem sempre são fáceis de lidar. Um filho que pensa diferente, age de forma diversa, exige dos pais um comportamento também novo, o que é bastante trabalhoso. Todavia, quando estas diferenças são aceitas, acolhidas e valorizadas, essas crianças podem ser ajudadas a desenvolver o melhor que há em si, deixando em segundo plano os defeitos. Mas quem não os tem? Defeitos precisam afastar ou podem ser aprendidos a tolerar, a amar apesar deles? Um aprendizado que poderão levar para toda a vida e usar em outros relacionamentos, elevando seu amor próprio.  


*Fernanda Rossi é psicóloga clínica de orientação Psicanalítica.